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Judith, 16 anos, filha única, foi trazida em meu consultório pelos pais, ambos professores, com diagnóstico de fobia. Segundo os pais ela teve um “surto” na escola quando uma professora ridicularizou e humilhou sua melhor amiga. Após este episódio ela não conseguiu mais retornar à escola e desenvolveu os sintomas de fobia escolar, depressão e crise de pânico.
O “surto” provocou um descompasso na vida de Judith. Ela passou a não se reconhecer mais, se perdeu de si e do que julgava conhecer de si mesma. Emergiu um estranho de si que ela não conseguia suportar. Na primeira entrevista ela me disse: “Eu estou estranha, me sinto esquisita, não me reconheço”. Intervi: sim, esta estranha também, é você.
A demanda dos pais ao tratamento era para ela voltar à escola. Afinal, filha de professores como não ser uma aluna exemplar? Judith apresentava grande apatia, sinais de melancolia, tristeza profunda, inapetência, perda de peso, com excesso de sono e fobia escolar. Iniciou a análise e, neste período, como alternativa para não interromper os estudos, começou a ser acompanhada com tutoria da escola, fazia as matérias em casa e os pais levavam à escola.
Ela estava sendo pressionada para voltar à escola, era o resultado esperado pelos pais em relação à análise. Em uma das sessões afirmou: “Eu não consigo mais ir à escola”. Pergunto: “o que faz você acreditar que não consegue ir?” “Não é que eu não consiga, eu não quero ir”! Ouviu-se, surpresa.
Dizer o que queria, no caso, o que não queria, aos seus pais e no que isso os desapontava na expectativa do seu brilhantismo intelectual, se responsabilizar por seus estudos e marcar uma posição em relação a suas escolhas, foram os movimentos iniciais de Judith em análise. Um dos seus primeiros movimentos foi frequentar aulas de balé. A dança foi um caminho de expressão que ela encontrou. A timidez, o medo do ridículo, o olhar do outro e seu julgamento, foram temores que ela foi ultrapassando nessa experiência com a dança. Ao final de uma das sessões disse: “perdi o meu rebolado na escola, mas, encontrei-o na dança”.
Judith terminou o ensino médio no programa de inclusão para alunos com problemas emocionais e psiquiátricos. Apesar do diagnosticado, que lhe dava o benefício do programa e marcava a etiqueta da doença, não se acomodou e nem paralisou. Do seu “surto”, retirou o maior saldo, do contato com sua estranheza, a responsabilidade de inventar um jeito mais autêntico de ser, rompendo com a expectativa de filha e aluna perfeita e se arriscando em escolhas singulares.
Ao final daquele ano, com 17 anos, prestou vestibular e entrou para a faculdade de gastronomia, retornando à sala de aula sem problemas de medos ou fobia escolar. Formou-se. Continua fazendo balé e abriu em um buffet. Cuida da preparação de eventos e festas, confecciona doces, salgados e administra com prazer. Ainda em análise, hoje, com 22 anos, busca cultivar em seu trabalho e na dança a arte na vida. Judith, come, dança e ama.
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