Samedi 28 janvier 2012 ٠ 18h30 [GMT+ 1]
NÚMERO 142
Eu não teria faltado a um Seminário por nada do mundo— Philippe Sollers
Nós ganharemos porque não temos outra escolha — AgnÈs Aflalo
Storytelling e julgamento
Por Éric Laurent
A conquista contemporânea da opinião depende mais e mais da coerência da história que vem representar uma tese, através das múltiplas mídias e da enumeração dos fatos que se seleciona para sustentá-la.
A campanha de imprensa preparada por profissionais para sustentar a tese de um conjunto de associações de pais de autistas conta uma história. Ela caricatura a psicanálise para propor unicamente as terapias comportamentais como solução adaptada ao autismo em seu conjunto, e sobretudo a extensão de seu espectro. O epicentro da história é a França, ou melhor, a França e a Bélgica, mas esta história deve ser pensada globalmente.
Resumamos. Por procedimentos que consistem a enganar a boa fé, um suposto documentário reduz a diversidade das posições dos psicanalistas interrogados a uma tese ridícula: a causa do autismo é uma falta dos pais, especialmente da mãe. A redução ao leito de Procusto é estabelecida por amálgamas e distorções. Uma vez estabelecida a tese, a honra dos pais assim incriminados, « culpabilizados”, só pode se lavar pela denúncia a mais feroz, a uma tal abordagem. Tudo poderá ser destinado a este efeito e deformado para sustentar a causa.
A operação é coberta pelo recurso à ciência que afirmaria poder dar conta do conjunto dos fenômenos por uma estrita consideração biológica, sem levar em conta a relação que mantém o sujeito ao mundo, tanto a aparência de certos autistas permite pensar neste corte. O drama da saúde pública colocado por esses sujeitos coloca, portanto, no primeiro plano, o acolhimento desses sintomas em um discurso. Mesmo se se explica o surpreendente crescimento do número de casos por artefatos estatísticos, é preciso explicar porque o olhar clínico detecta melhor esses sintomas. Além disso, é o único « problema » psíquico onde a metáfora da redução do problema a um ‘’desequilíbrio químico’’ como na depressão, por exemplo, é recusada.
As crises de agitação, de angústia, de fechamento, podem ser estimuladas ou temperadas por medicações apropriadas, ninguém afirma tocar a causa. De onde as esperanças colocadas na causa genética. Até o instante, nenhuma medicação específica foi proposta. Que fazer?
Pioneiros inspirados pela psicanálise propuseram desde os anos sessenta, em diversas instituições, uma abordagem misturando métodos relacionais, jogos, atividades e aprendizagens. As instituições e seus mix terapêuticos se endereçaram a todas as espécies de patologias. Em 1987, Ivan Lovaas, em um artigo ruidoso, propõe de se centrar sobre um método de repetição intensiva de comportamentos simples, e de reservá-lo aos autistas. Ele será fortemente estruturado pela abordagem recompensa-punição. Ele o nomeou Análise do Comportamento aplicado. Em inglês, Applied Behavior Analysis, (ABA). Nada de referência à cognição. O método encontrou nos EUA um sucesso à medida do prestígio reconhecido à abordagem comportamental nesta zona cultural. Portanto, as objeções não têm faltado e não somente da parte dos psicanalistas, contra a extensão dos métodos comportamentais em seu reducionismo adotado à extensão do “espectro dos problemas autísticos”. As objeções têm sido éticas, técnicas e econômicas.
A ficção na qual se inscreve o panfleto « O Muro » sustenta que as múltiplas questões que coloca o tratamento do autismo se reduzem de uma parte a um afrontamento entre psicanálise e terapias comportamentais e de outra parte entre a França, país do passado, homônimo da “velha Europa”, e os Estados Unidos, país do futuro. Na França, a psicanálise faria ainda obstáculo à ciência e aos Estados Unidos, as terapias cognitivo- comportamentais seriam reconhecidas sem compartilhamento, como o tratamento de referência. É uma ficção bifocal, mas falsa para cada uma dessas casas.
Na França, os tratamentos dos sujeitos autistas, inspirados pela psicanálise têm em conta os avanços da ciência, utilizam os medicamentos adequados, recomendam a inclusão das crianças nas instituições que lhes convém mais, numa escola onde se possam adaptar as aprendizagens, segundo o que é disponível. Eles estão de acordo sobre a necessidade de uma continuidade de interpelação desses sujeitos. Há alguma coisa « a lhes dizer », sem, portanto, falar “de intensidade”. Eles colocam o acento sobre uma abordagem relacional a partir dos signos de interesse manifestados pela criança. Não uma estimulação – repetição para todos, mas uma solicitação sob medida, uma abordagem bottom-up, e não top-down. As instituições onde tal abordagem é possível são muito pouco numerosas na França. Esta raridade não vai no sentido da chamada “dominância ideológica” censurada à psicanálise. É por isso que um número grande de crianças francesas é enviado à Bélgica onde tais instituições as podem acolher. As autoridades tutelares consideram que elas têm resultados que as colocam na fileira de melhores da disciplina. Elas são financiadas pelo equivalente da previdência social.
Nos EUA, os tratamentos comportamentais encontram objeções e limites: éticos, econômicos e legais. A objeção ética dá-se sobre o número e a intensidade das punições a se exercer para forçar o isolamento do sujeito. Qual é o justo preço do enxerto de um comportamento repetitivo sobre um sujeito muito fechado sobre si mesmo? Certos praticantes do método ABA puderam cristalizar queixas para « comportamentos não éticos » para com as crianças. Até onde também se podem transformar os pais em educadores intensivos de suas crianças? Alguns têm feito isso até a exaustão, provocando uma espécie de burn-out parental.
No Canadá, país particularmente sensível à proteção das comunidades, a objeção foi até considerar a imposição desses comportamentos como um ataque aos direitos do sujeito autista como tal. Era preciso partir do autismo para conceber aprendizagens apropriadas e não impor a aprendizagem repetitiva simples. Entre as duas posições radicais, os EUA e o Canadá apresentam toda uma série de abordagens mistas que desejam se afastar de técnicas rígidas assimiláveis a um adestramento, para solicitar as particularidades da criança na extensão do ‘‘espectro’’ dos autismos. Nos EUA, as técnicas ABA são muito mais consideradas como passado.
A objeção é também econômica. Nesse caso os resultados da aprendizagem intensiva se mantêm mal, mais-além do quadro estrito no qual eles são administrados o método supõe um educador individual em tempo integral. Um tratamento standard foi assim avaliado a U$60000 por ano. As associações de pais conquistados por esses métodos têm tentado fazer com que sejam reembolsados pelos Estados, que, nos EUA, são encarregados das despesas de saúde. É assim que, solicitada, a Califórnia recusou esse reembolso, assim como Ontário, no Canadá.
A ficção do « Muro » e suas simplificações polêmicas fazem esquecer a pluralidade dos pontos de vista que produz a complexidade do autismo. Encontra-se esta pluralidade nos comentários que o panfleto tem provocado. No mesmo dia, o jornal « Le Monde » e seu suplemento eram sobre duas grandes ondas muito diferentes, sem falar de outros jornais. A realizadora do « Muro » evocava a simpatia dos jornalistas para com aquela que se apresentava como um deles, injustamente sujeitos à censura. Ela se apresentava também como documentarista, se bem que essa fosse uma vocação tardia, e mesmo como uma estudante de psicanálise frustrada. Ela estava em todos os lugares.
No « Suplemento do Le Monde », uma jornalista que até aí não estava cuidando de questões de saúde mental foi seduzida pela tese do panfleto. Nada da psicanálise encontra graça aos seus olhos, e mesmo logo que uma das entrevistadas do filme lhe diz exatamente as teses que ela defende, ela a encontra de uma “altura arrogante ». No Jornal, por outro lado, Catherine Vincent, mais aguerrida, faz referência à pluralidade das abordagens, ao « apelo dos 39 », e contesta em favor de um ecletismo necessário. No « Herald Tribune » um artigo retoma o storytelling França-EUA e se inscreve na ficção proposta. Entretempos, a folha americana da história precisava-se e a realizadora anunciava sua presença na Filadélfia no congresso ABA na quinta 26, onde ela desejava apresentar seu filme, após uma passagem por New York. Pode-se duvidar que seu método possa convencer mais além dos adeptos do « French bashing ». Nos EUA, a diversidade de opiniões é muito enraizada. O julgamento acontecido ontem constata os maus procedimentos utilizados pelos partidários de uma causa que lhes parecia boa e que justificava então todos os meios. A invocação de Michael Moore pelo advogado da realizadora e da sociedade de produção, logo de sua declaração de apelação, só reenvia à ficção França-EUA. Para o primeiro ensaio documentário de nossa polemista, o traje é um pouco pesado de vestir. ₪
27 de janeiro de 2012.
N.T: Foi mantido o termo storytelling que, além de significar contando histórias, é também um novo conceito de marketing que busca encantar o consumidor pela história do produto.
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Tradução: Nora Gonçalves
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