25 de maio de 2016

IPLA: O Mundo - Visto pela Psicanálise. Transhumanismo e uberização, por Alain Mouzat



Luc Ferry, sempre atento às mudanças no contemporâneo, acaba de lançar um novo livro na França, em que anuncia como a tecnomedicina e a uberização do mundo vão transtornar nossas vidas


O debate sobre o transhumanismo começa a se tornar familiar: trata-se da inexorável mudança que está acontecendo na medicina, que está passando de uma medicina terapêutica a uma medicina melhorativa. As NBIC - a nanotecnologia, a biotecnologia, a informática e as ciências cognitivas - nos seus avanços mútuos e combinados estão preparando para nós uma medicina do futuro que vai transformar a humanidade: melhoria da raça humana, eugenismo, fusão física entre homem e máquina, sonhos de imortalidade...

Será que todos os sonhos – até mesmo os pesadelos – estão ao nosso alcance? Luc Ferry, sempre atento às mudanças no contemporâneo, acaba de lançar um novo livro na França, cujo título, traduzido ao pé da letra, A revolução transhumanista : como a tecnomedicina e a uberização do mundo vão transtornar nossas vidas, anuncia uma reflexão aberta para horizontes mais amplos.

Numa entrevista à rádio francesa, em dezembro passado, ele explicitava seu pensamento, rejeitando por um lado, como delirantes, os profetas futurólogos como Ray Kurzweil que anuncia a imortalidade para 2045, e de outro, os bio-conservadores – a expressão não é dele, mas de Laurent Alexandre - que vão de Fukuyama a Hans Habermas. A posição de Ferry é de não rejeitar o que já é inexorável. Os avanços das NBIC já há tempo permitem escolher um embrião não portador de doença, permitindo assim pensar em erradicar doenças genéticas hoje sem cura. A possibilidade de editar o DNA abre todas as perspectivas de manipulações genéticas. 

Mas a originalidade de Ferry é de recorrer a outro fenômeno, que ele chama nessa entrevista de uberização da sociedade - do nome da sociedade de prestação de serviço de transporte privado de passageiros por meio de aplicativos. Trata-se do aparecimento de uma “economia colaborativa” na qual cada um pode oferecer o que tem para pagar, não passando assim pelas grandes empresas. Desse modo, posso alugar meu apartamento na Paulista no fim de semana. Essa economia nasceu graças exatamente ao desenvolvimento da internet.

Em suma, diz Ferry, transhumanismo e uberização da sociedade vão de par: é a abertura de novas possibilidades, a queda das barreiras morais, tecnológicas e sociais, a desregulação que leva a uma merchandização do mundo, onde tudo, até os ativos privados, vira mercadoria. 

Frente a isso que solução? Proibir ou deixar acontecer, geralmente é o dilema ao qual se prendem as sociedades. A solução, diz Ferry, será a regulação.

Mas, podemos lhe objetar, não será exatamente em ruptura de qualquer regulação que aparecem essas inovações como libertadoras, e que elas nos seduzem? Não seria melhor pensar com o jurista Tercio Sampaio Ferraz Junior que "a liberdade de um começa onde começa a liberdade do outro"? 

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